O ChatGPT gasta meio litro de água para escrever um simples mail de 100 palavras. Vai voltar a usá-lo depois de saber isto?
- Virgílio Azevedo
- 16 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: 29 de ago.

A poluição do ar e as grandes emissões de carbono são custos ambientais bem conhecidos da Inteligência Artificial (IA), devido ao enorme consumo de energia. Cada servidor (computador) gasta tanta energia como uma casa inteira. Mas um facto menos conhecido é que a IA também consome quantidades muito elevadas de água doce
Um estudo feito pelo jornal Washington Post e pela Universidade da Califórnia concluiu que escrever um simples e-mail de 100 palavras usando o ChatGPT consome cerca de meio litro de água para arrefecimento dos supercomputadores e equipamentos dos centros de dados. O ChatGPT é um dos conhecidos modelos avançados de linguagem que utiliza Inteligência Artificial para gerar textos de forma coerente e semelhante à linguagem humana.
Como escreveu recentemente Henrique Raposo, colunista do jornal Expresso, “a questão não é se a Inteligência Artificial vem para ficar com os nossos empregos, mas se vem para ficar com a nossa água”.
Toda a gente fala de Inteligência Artificial (IA). Tornou-se a espinha dorsal de avanços científicos, do crescimento acelerado de negócios e de abordagens para desafios globais, como as alterações climáticas. Os modelos de IA são essencialmente funções matemáticas complexas com muitos parâmetros. Os recursos cada vez maiores da IA dependem de enormes volumes de dados e cálculos computacionais intensivos para extrair padrões úteis.
Grande consumo de energia gera muito calor
A poluição do ar e as grandes emissões de carbono são custos ambientais bem conhecidos da IA, devido ao grande consumo de energia. Com efeito, cada servidor (computador) gasta tanta energia como uma casa inteira. Mas um facto muito menos conhecido é que os modelos de IA também consomem muita água doce de duas maneiras: no local onde são usados e para a geração de eletricidade externa.
A nível local, o consumo massivo de energia dos servidores de IA gera muito calor. Para dissipar esse calor para o ambiente externo e evitar o superaquecimento dos servidores, os centros de dados usam torres de arrefecimento e/ou ar externo, que precisam de uma quantidade impressionante de água limpa e fresca. As torres de arrefecimento dependem da evaporação da água para produzir água fria, e o ar externo precisa de água para assistência à evaporação quando está muito quente e para controle de humidade quando está muito seco.
A nível externo, a geração de eletricidade também consome muita água por meio do arrefecimento das centrais termoelétricas e nucleares, além da evaporação acelerada causada pelas centrais hidroelétricas. Mas há ainda um outro consumo de água das empresas fornecedoras de dispositivos para IA. Por exemplo, para produzir um único microchip são necessários mais de 8.000 litros de água ultrapura.
Segundo Shaolei Ren, professor da Universidade da Califórnia, a procura global de IA pode levar ao consumo de cerca de quatro a seis mil milhões de metros cúbicos de água em 2027, o que é metade do consumo de água do Reino Unido, país que tem 68 milhões de habitantes.
Henrique Raposo alerta que “estamos a falar de água potável das redes públicas de água, não estamos a falar do desvio de um rio que entra na central para arrefecer” e depois regressar ao seu leito. “Estamos a falar do uso de água potável que é canalizada para os sistemas de arrefecimento e que acaba por evaporar, ou seja, não é reutilizada, desaparece literalmente”. Uma fábrica “pode desviar água para arrefecer as máquinas e depois pode devolvê-la por canais, mas IA não devolve nada: a água que entra dentro dos centros de dados evapora, ponto”.
O consumo de água pela IA cria tensões sociais
Shaolei Ren salienta que “como as secas são uma das primeiras consequências catastróficas das mudanças climáticas, todos devem assumir sua parcela de responsabilidade para enfrentar o desafio da água”. E já se observam “tensões acirradas sobre o uso da água entre os centros de dados de IA e as comunidades locais”. Se os modelos de IA “continuarem a consumir muita água, essas tensões vão tornar-se mais frequentes e poderão levar a turbulências sociais”.
Na Catalunha, por exemplo, devido à falta de água, o Governo impôs muitas restrições ao seu uso pela população. Mas ao mesmo tempo está a ser autorizada a construção de vários centros de dados que, obviamente, vão consumir muita água.
Em Portugal, está prevista a construção de uma gigantesca fábrica de Inteligência Artificial em Sines, no Alentejo. O investimento poderá atingir quatro mil milhões de euros, e inclui a compra de 100 mil processadores, instalados em 12.500 servidores. O objetivo é acelerar o desenvolvimento da IA em setores como as telecomunicações, saúde, biotecnologia, oceanos, defesa, energia e aeroespacial.
Não se sabe ainda onde essa fábrica irá buscar tanta água numa região como o Alentejo, que é a mais seca do país. Mas há alternativas. Em Sines amarram vários cabos submarinos que ligam a Europa à América do Sul e aos EUA, e por isso mesmo está a ser construído o megacentro de dados da empresa Start Campus, que prevê o uso de água do mar para o arrefecimento das máquinas.





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